Congresso 2015

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segunda-feira, 29 de julho de 2013

Mitos da Gestão Pública




Hélio Janny Teixeira
Doutor e Livre-docente em Administração pela FEA-USP e professor da mesma instituição.

Quem é melhor: o público ou o privado? As empresas ou o governo? Os políticos ou os cidadãos comuns? A maioria tem a resposta na ponta da língua: nada pior do que o público, o governo e os políticos. As perguntas, apesar de infantis e maniqueístas, geram respostas com conseqüências sérias e portanto deixam de ser coisa de criança. Preconceitos e concepções errôneas podem levar a decisões equivocadas e a ações desastrosas. Se o Estado é um mal, ele deve ser reduzido, deixando as soluções para o bem, ou seja, para as empresas e para o mercado. Se os políticos não funcionam, será melhor acabar com a democracia? Mas por que estas crenças são tão fortes em nosso país?

Criticar ou pensar nos erros do governo e dos políticos, principalmente pela manhã, após leitura do jornal ou escuta da rádio preferida, provoca uma sensação de alívio e de dever cumprido, ao mesmo tempo que expia as próprias culpas. A satisfação é garantida e não há risco de encontrar pessoas com argumentos contrários, ou seja, que defendam o Estado. Mas isto é correto? As críticas são procedentes? Por um lado sim. O Estado representa uma grande síntese com volume de operações gigantesco, e obviamente apresenta grandes dificuldades e desperdícios no seu funcionamento. Trata-se da instância máxima e mais importante da articulação da sociedade e, conseqüentemente, é e sempre será o principal responsável pelas suas grandes dificuldades. Ainda mais após a Constituição de 1988, que legitimou o crescimento da demanda por serviços públicos. Embora louvável, a evolução dos direitos sociais, e conseqüentemente das legítimas demandas da população, não deixa de causar apreensão quando confrontada com a capacidade de resposta do Estado tanto do ponto de vista qualitativo quanto quantitativo. Educação, saúde e segurança são exemplos cruciais de serviços insuficientes e constantemente criticados pela população.

Mas vejamos o outro lado da questão numa análise menos apaixonada. Ineficiência não é exclusividade do setor público, nem a eficiência só está presente no setor privado. E mais. O lucro muitas vezes não é uma boa medida de eficiência. Uma empresa eficiente do ponto de vista produtivo (relação entre insumos utilizados e produto gerado) pode ser deficitária em função dos preços a que está submetida sua produção (por exemplo, para combater inflação). Em geral, compara-se o que há de pior no público com o que há de excelência na área privada.

Outro mito que deve ser desfeito é o que diz que a sociedade é bem melhor do que o Estado e seus governantes. O bom cidadão seria um injustiçado diante do mau governo. A verdade não é bem essa. Existe dificuldade histórica da sociedade em organizar-se a fim de representar seus interesses desde condomínios, times de futebol etc. até os partidos políticos. É óbvio que temos os melhores jogadores de futebol do mundo. Mas o que falar dos clubes (que além de falidos não pagam seus encargos sociais), das federações, calendários etc? O individualismo e o utilitarismo imediato suplantam a ética da solidariedade e a preocupação com o bem comum. No quadro de uma sociedade marcadamente desigual, a cultura brasileira nunca teve entre os seus traços fortes a idéia de igualdade de direitos para todos, nem a valorização do interesse coletivo. Por decorrência e também para mascarar as próprias culpas, as pessoas tratam indevidamente o público como algo exclusivo do Estado. Se os problemas não são resolvidos, cresce a responsabilidade alheia. Trata-se de mais uma ilusão. Nunca teremos boa saúde e educação para todos sem profundo envolvimento dos indivíduos, das famílias, dos empresários e seus impostos, e da sociedade em geral.

A terceira grande ilusão é representada pelo entendimento de que o Estado está diminuindo e deve diminuir ainda mais. Muito embora a afirmação pareça interessante, ela não corresponde aos fatos. Todas as estatísticas recentes mostram, salvo exceções não-relevantes, que o Estado cresceu em todos os países, o que pode ser verificado por meio de medições como participação das despesas públicas em relação ao PIB. (Ver World Development Report – The State in a Changing World – 1997).

As ilusões e os mitos mencionados, embora com algum conteúdo verdadeiro, uma vez generalizados, não só obscurecem o entendimento dos problemas como levam a soluções equivocadas. Concluímos com três idéias que resumem o ponto de vista que procuramos apresentar neste artigo:
  • o Estado e o governo não são piores e mais ineficientes do que o mundo privado e a sociedade em geral. Cada instância de organização societária - Estado, mercado e sociedade - tem suas mazelas, limitações e potencial contributivo que deve ser entendido e articulado;
  • não há como fortalecer o Estado, para que enfrente as pressões como globalização e desemprego, com menos impostos e despesas; e, por último,
  • é fundamental ter como meta o fortalecimento do interesse público como valor compartilhado pela sociedade e não apenas como algo localizado institucionalmente no Estado.


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