Congresso 2015

Congresso 2015

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Entrevista com os coordenadores do PAPRH Ivani Maria Bassotti e Thiago Souza Santos


Como e por que surgiu o PAPRH?

Ivani Maria Bassotti
Ivani: O PAPRH surgiu de uma proposta de trabalho da equipe da UCRH, resultado de certo inconformismo sobre como estava sendo tratada a questão da capacitação, inclusive no nosso próprio meio. 

Fala-se muito em política de recursos humanos que o governo deve adotar, mas não há conscientização dos gestores quanto a suas competências em relação à gestão de pessoas. Gestão de pessoas não se faz nos órgãos de recursos humanos. Gestão de Pessoas  é feita diretamente pelos gestores em geral. 


Um dos grandes entraves na gestão de pessoas é a ausência de definição de um perfil para os profissionais. É muito comum gestores pedirem mais colaboradores, e, quando esses profissionais não correspondem às expectativas, os gestores simplesmente os disponibilizam. Essa é uma das razões de termos, ao mesmo tempo, falta e excesso de pessoas no serviço público.


A administração pública tem vários entraves a superar. Os concursos públicos, por exemplo, são complexos, a estabilidade mais ainda. Se não houver um entendimento coeso – e tratamos essas questões –, sempre teremos inchaço ou insuficiência de pessoas na administração. 



Você acha que os concursos devem ser aperfeiçoados?


Ivani: Sim, deveriam ser mudados. O problema é enfrentar as questões que nós levamos para discussão no congresso, como a da rigidez jurídica, em que qualquer subjetivismo é rejeitado amplamente. É muito difícil selecionar pessoas nesse contexto. Os gestores também têm receio desses enfrentamentos e por isso acabam delegando essa tarefa às instituições que prestam esse serviço. 

Nem mesmo as áreas que demandam se envolvem na realização dos concursos, salvo algumas exceções, como áreas mais técnicas e especializadas (fiscalização e advocacia pública). Observa-se que, nessas áreas, há muito subjetivismo nos concursos, mas consegue-se quebrar barreiras. 


Não podemos nos esconder por trás dessa judicialização. Devemos demonstrar que estamos fazendo o melhor pela administração pública, que os critérios são mais eficazes, que a linha adotada será mais eficiente na seleção, que não se trata de subjetividade, mas de avanço para a administração.



Mas os gestores de RH podem fazer isso?


Ivani: Não se trata de tirar esses problemas do RH, mas de dividir isso com todos os gestores da administração. Conforme já disse, gestão de pessoas não se faz só no RH. Esse é o mote de todo o programa: fazer esse envolvimento. Não se trata de uma obrigação da UCRH, mas de todos os gestores públicos, com o apoio dos RHs. A conscientização tem que ser geral. Esse é o papel do PAPRH.



E qual é o papel das escolas de governo?


Ivani: Estamos tentando melhorar a interlocução para, juntamente com elas, alcançar um melhor aproveitamento da capacitação no Estado. 

Hoje, com tantas escolas dotadas de recursos próprios, cada um acaba olhando somente para a sua própria ilha, quando, na verdade, somos um grande arquipélago e temos que olhar para o contexto geral. Estamos buscando outras saídas para articular isso adequadamente em termos de capacitação no Estado. Nós podemos sentir essa necessidade, embora a incumbência não seja nossa.


A quem compete, então? Qual seria a solução?



Thiago: Nós temos competência legal em relação à capacitação, mas nunca houve coordenação das escolas. Há uma fragmentação no Estado a esse respeito, projetos isolados que nunca se conversam. Eles vão crescendo e virando pequenos monstrinhos. A gente vai fragmentando aos poucos e isso parece ser um “valor” na administração pública, não só no âmbito das escolas de governo. Torna-se uma moda, então vamos criar as escolas, depois a moda muda, então criam-se novas carreiras iguais, e depois muda tudo de novo porque não há mais interesse. Por isso estamos nos propondo a coordenar esse trabalho. Se nós temos competências em relação à capacitação, e as escolas são os grandes pilares de capacitação nos órgãos, nada melhor do que começar a conversar sobre isso. A ideia surgiu numa reunião do tecReg sobre o curso de formação em diversidade sexual em 2009, quando saiu o primeiro decreto. Percebemos que havia diversas iniciativas iguais sendo geradas sem qualquer tipo de interlocução. Isso provoca não só falta de direcionamento, como aumento de custos. Não são poucas as ações no Estado que são muito similares. As pessoas não se conversam.


Elas não competem entre si também?


Ivani: Sim, competem. E quem tem mais recursos compete em melhores condições. Há um desnível muito grande. Compras, por exemplo. Existem diversos cursos de compras oferecidos por escolas públicas e privadas. O Estado, apesar de possuir escolas pra isso, compra fora. Mas, quando você vai testar o conhecimento adquirido, percebe que está desnivelado. Se surge uma nova metodologia, só quem tem orçamento pode fazer, e só seus funcionários podem se inscrever, embora haja capacidade para atender a outras secretarias.


Thiago: Fizemos um levantamento neste ano a respeito da programação das escolas e descobrimos que 62% dos cursos eram recorrentes entre elas – excluídas as formações específicas das Secretarias de Saúde, Educação e Segurança. Para voltar ao exemplo da formação em compras, ela se repete em cada secretaria e suas autarquias, ao passo que haveria uma redução significativa de custos, ganhos de eficiência e nivelamento de qualidade se houvesse uma melhor articulação e integração de esforços.



Se a UCRH não pode fazer essa coordenação, o que poderia ser feito dentro de seus limites?

Thiago: Nós não temos a atribuição formal, mas existe um espaço de gestão em que basta ter boa vontade para fazer as coisas acontecerem. Como nós detemos a competência em matéria de formação, o que nós fizemos foi convidar as escolas a participar e colaborar. Ao final das reuniões, as escolas concordaram e até acharam que nós deveríamos assumir esse papel de coordenação das atividades. Há muitos anos discute-se a formação de uma rede de escolas, mas a ideia nunca avançou pra valer.



Em que pé está isso?


Thiago: Nós fizemos três encontros entre as escolas e entregamos as propostas ao governo. Mesmo que não haja formalização, pretendemos que as escolas atuem de forma integrada já a partir de 2015. Esperamos realizar mais encontros para discutir as diretrizes que as escolas adotarão.


Ivani: A formalização é necessária para permitir o empoderamento. Mas, se não for possível, vamos continuar o que já vínhamos fazendo no decorrer deste ano. Os encontros foram muito bons, todos veem as mesmas necessidades, todos concordaram. O fato é que há uma necessidade geral de interlocução entre essas “academias”, o isolamento nem sempre traz conforto.



O que vocês acham que deu certo? O que deixou vocês felizes?

Ivani: Os efeitos imediatos são sempre subjetivos. O efeito mais importante é a mudança de comportamento, mas ela nunca é imediata, requer algum tempo para acontecer. As ações contínuas é que são transformadoras. Se houver descontinuidade do trabalho que estamos fazendo, acredito que não vamos obter resultados. O bom do PAPRH é que ele está sendo contínuo. Mas uma pequena mudança de governança, como está sendo cogitada, deixa o programa frágil. A simples mudança pode colocar tudo a perder. Por isso estamos articulando com as escolas de governo para garantir a manutenção do programa. Quando digo que o programa vai bem é porque ele está crescendo. Mas não em quantidade e, sim, em qualidade, ano após ano. Ninguém duvida dessa qualidade, dos professores convidados, dos temas abordados, que são os mais úteis para os gestores, e das inovações para o setor público sem descuidar das questões do dia a dia. Está havendo maior consciência de que estamos no caminho certo, e isso é o melhor de tudo!


Como você percebe isso?


Ivani: Quando eu vejo a programação lotada, quando eu chego a um encontro de “Diálogos” e não tem lugar pra sentar, quando eu vejo o número de visualizações do “Conversações”,  as avaliações dos cursos pelos alunos. Está acabando aquela história de enviar alguém para treinamento só para se livrar dele. Quando você percebe essa mudança, é porque o programa está dando certo.


3º Congresso


Qual é a importância do congresso para o PAPRH como um todo?


Thiago: O PAP é um conjunto de ações. O congresso serve para congregar as pessoas em torno do futuro da gestão de pessoas. Ninguém vai a um congresso para aprender a mexer no Excel nem como fazer um concurso. O papel do congresso é reunir as pessoas para repensar um pouco os valores que nós carregamos, as nossas possibilidades, e também quebrar as verdades que a gente tem muito fixas nas nossas vidas. Não é à toa que todos os nossos congressos terminam com uma palestra que provoca a reflexão. Não se trata de um treinamento. O congresso não é um sucesso só porque as pessoas gostaram, mas porque elas puderam parar para pensar. Em breve, vamos começar a acompanhar melhor os resultados obtidos após cada uma das atividades do PAP, inclusive o congresso.

Ivani: O que os governantes precisam perceber é que não basta oferecer apenas treinamento. É preciso pensar em formação contínua, em desenvolvimento humano integral. Todos precisam dessa ajuda. Eu mesma me desenvolvi sozinha em 35 anos no serviço público. Somente a partir de 2004 é que começamos a oferecer um apoio maior ao aperfeiçoamento profissional dos gestores e servidores em geral.




É isso que você teme que seja perdido, se houver uma mudança de governança?


Ivani: Eu sempre tenho esse receio, porque não podemos parar. Isso depende de uma série de fatores, de orçamento, de quem será o coordenador da unidade, do secretário, do governante, ou seja, depende de uma conscientização geral.


Ou seja, voltamos à questão da continuidade...


Ivani: A UCRH conseguiu sobreviver a todas as grandes mudanças de governo. E não foi só porque está em lei. Foi porque teve a competência necessária para desempenhar o seu papel legal. Na administração de recursos humanos ela sobreviveu melhor, pois essa é uma matéria árdua pela qual a administração pouco se interessa. Porém, as demais áreas de RH ficaram relegadas, como a política para recursos humanos, de forma mais ampla, ou mesmo a própria capacitação, de forma mais específica. A nossa sobrevivência parece garantida. A forma e atuação são mais importantes.


Thiago: Sobreviver não é o bastante. Podemos continuar aqui e ficar inertes. A questão é menos legal e mais de postura de gestores. Existe um problema fundamental na administração pública com relação a “valores”. Muitos veem o setor público apenas como fonte de renda e pouca preocupação com a função e a missão públicas. Quando encontram uma situação difícil, é muito fácil se desmotivarem. A evolução é feita apenas pelo tempo de serviço, não se observa esse perfil . Há até quem goste de passar despercebido. Tem uma coisa de perfil, de quem comanda, em todos os níveis. Aqui a Ivani faz a gente se mexer, pra que a gente avance. Portanto, o problema não é legal. O legal poderia garantir uma sobrevida, mas não garantiria o crescimento da área de gestão de pessoas, não nos fortaleceria. Com o pouco que temos já fazemos muito.



O que falta para fazer mais?


Ivani: São poucas pessoas preparadas para fazer esse tipo de trabalho. Atualmente, a UCRH atua com 40 pessoas. Temos, por obrigação, de cuidar de toda a administração direta e autárquica. Então precisamos de mais pessoas? Não necessariamente. Precisamos de pessoas certas nos lugares certos. Esse é o grande “X” da questão.


Thiago: Essa foi uma das questões colocadas no congresso. A tendência é ter que produzir mais com muito menos gente, pois toda a população está envelhecendo. Esse é um desafio que pode parecer muito cruel, mas não é tanto assim, que é conseguir coisas mais efetivas com menos recursos. Isso não é para enxugar o quadro de pessoal pura e simplesmente. É uma realidade, as demandas estão crescendo muito por parte de toda a população, e existem ferramentas que possibilitam a redução de determinados tipos de trabalho burocráticos que antes demandavam muitas pessoas. Elas passarão a desempenhar atividades mais intelectuais, pois esse é o perfil da mudança, e irão atuar em outras áreas. Elas não serão dispensadas. O problema é quando você tem muita gente empregada e não consegue produzir mais.



O tema do congresso foi “uma nova gestão é possível”. Como ela será?


Ivani: Disse, em uma das mesas de que participei no congresso, que, se nós pensarmos que a gestão é possível, ela já será nova. O mais comum é acharmos que nada é possível, tudo é difícil, os entraves, nada pode ser feito. Mas não é assim. Há um equívoco, as pessoas esperam que as coisas aconteçam na administração pública diferente do que acontece na iniciativa privada. Na realidade, as dificuldades são as mesmas, então você tem que ir atrás e batalhar. 

Eu acredito na gestão pública, simplesmente. Quando a gente fala “nova” é porque há algumas questões em que precisamos avançar, modificar, repensar a administração e introduzir novas práticas, isso é evolutivo, é da sociedade. Você não pode imaginar que será “togado” a vida inteira. É a própria sociedade que exige a mudança. O novo vem disso. O quadro “Santo de Casa Faz Milagre”, do programa inovaDay, da Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Regional, demonstra isso muito bem. Pequenas iniciativas individuais podem fazer uma grande diferença.  Procuramos estimular mais esse tipo de comportamento, e essa foi a grande sacada!


Thiago: A valorização dos servidores não deve ser apenas pecuniária. Valorizar não é só aumentar salário. Valorizar é reconhecer atitudes e comportamentos, não dar presentes. Isso vale com a família e com todo mundo. Com o servidor não é diferente. Esse aspecto da valorização é essencial, porque as pessoas às vezes acham que estão agindo sozinhas e entram no discurso de que por que eu vou fazer se não sou reconhecido nem tenho exemplo a seguir? As pessoas querem que o exemplo venha de cima para justificar a inação. Eu aposto que, em muitas coisas da vida, as pessoas não olham apenas o exemplo que vem de cima, olham aquilo que os pais ensinaram. O pessoal do Santo de Casa fez aquilo que achava que era o dever deles. A administração precisa demonstrar isso: que existe um sentido na função pública. É um equívoco fazer comparações com as empresas privadas, cujo desempenho frequentemente também deixa muito a desejar. As duas organizações em que a população mais confia são públicas: os Correios e o Corpo de Bombeiros. O maior índice de reclamações no Procon são das empresas privadas de telefonia. Mas o nosso esporte favorito ainda é o apedrejamento da administração pública.

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