Congresso 2015

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sexta-feira, 18 de maio de 2012

A estabilidade funcional e a eficiência no serviço público - Parte 5

Lais Fraga Kauss*


5 GESTÃO PÚBLICA

5.1 CONCEITO – Administração Pública

A Administração Pública em sentido subjetivo é a composição dos órgãos que exercem as funções estatais. Em sentido objetivo, é a gestão dos interesses públicos, por meio de prestação de serviços públicos. Nas palavras da Dra. Maria Sylvia [17]:

"Em sentido objetivo, material ou funcional, a administração pública pode ser definida como a atividade concreta e imediata que o Estado desenvolve, sob regime jurídico de direito público, para a consecução dos interesses coletivos. Em sentido subjetivo, formal ou orgânico, pode-se definir Administração Pública, como sendo o conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas aos quais a lei atribui o exercício da função administrativa do Estado."

O exercício da Administração Pública, considerada em seu sentido objetivo, portanto, está presente em todos os órgãos e setores que prestam serviços públicos, com ou sem atendimento da população. Ora, o interesse público é o alvo em todas as atividades das repartições públicas, seja no atendimento direto ao público ou nas atividades internas.

Em sentido mais estrito, para melhor análise do objeto deste trabalho, é necessário destacar o papel dos servidores que exercem a gestão dentro da Administração Pública.

5.2 CONCEITO – Gestão e gestor

O conceito de gestão é bastante explorado pela ciência da administração. Não há uma definição única, inúmeros autores discorrem sobre o assunto e o conceito está em constante adaptação aos novos anseios e realidades sociais.

De acordo com o Prof. Paulo Nunes [18]:

"No conceito clássico adotado por Henri Fayol, o gestor é definido pelas suas funções no interior da organização: é a pessoa a quem compete interpretar os objetivos propostos pela organização e atuar, através do planejamento, na organização, na liderança ou direção e no controle, a fim de atingir os referidos objetivos. Daqui se conclui que o gestor é alguém que desenvolve os planos estratégicos e operacionais que julga mais eficazes para atingir os objetivos propostos, concebe as estruturas e estabelece as regras, políticas e procedimentos mais adequados aos planos desenvolvidos e, por fim, implementa e coordena a execução dos planos através de um determinado tipo de comando (ou liderança) e de controle."

A gestão, nesses termos, existe, ou deveria existir, em todas as organizações, públicas ou privadas, em que há objetivos a serem alcançados.

A gestão tem várias vertentes, pois trata de pessoas, recursos estruturais, procedimentos e formas de controle.

Na Administração Pública, são gestores todos os que exercem algum tipo de poder decisório, em qualquer das vertentes necessárias ao alcance dos objetivos do órgão ou mesmo do setor em que atuam.

Evidentemente, o gestor público vive realidades e limitações características, o que gera grandes dificuldades em adotar todas as novas tendências da ciência administrativa. Tudo na Administração Pública precisa de adaptações e trâmites burocráticos. Dessa forma, segue pequena exposição sobre a realidade da gestão pública.

5.3 A GESTÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – Adaptações e dificuldades

As teorias da administração são dinâmicas e estão em constante evolução. Hoje, por exemplo, as organizações privadas investem tempo e dinheiro em melhorar a qualidade de vida dos funcionários, pois estão convencidas de que isso otimiza o trabalho e aumenta o lucro final. Como tal postura poderia ser adotada em sua integralidade na Administração Pública em simultaneidade às exigências de licitação, as limitações e pré-destinações orçamentárias, à ausência do comprometimento com o lucro, à impossibilidade de avaliação, premiação ou punição clara e objetiva com base na produtividade?

O gestor público enfrenta desafios no dia-a-dia que muitas vezes já foram enfrentados, estudados e mesmo superados pela iniciativa privada. Todavia, isso não significa dizer que seja fácil resolvê-los. Isso se dá por vários fatores.

Em primeiro lugar, é necessário esclarecer que os gestores públicos, em regra, não possuem preparo educacional para a gestão. Os gestores são servidores de carreira, seja ela qual for, ou seja, advogados, químicos, engenheiros, etc., ou mesmo ocupantes de cargos em comissão não concursados.

Ora, há alguns servidores determinados em realizar um bom trabalho de gestão e que realmente se importam com a função. Tais servidores buscam os conhecimentos necessários, estudam em suas próprias expensas, pesquisam.

Isso seria ótimo se fosse suficiente. O fato é que, como ressaltado no parágrafo de introdução deste item, as soluções adotadas na administração privada esbarram em obstáculos constitucionais para a aplicação a contento na gestão pública. Além disso, é necessário mencionar que os gestores interessados em investir e aprender por conta própria, sem qualquer incentivo da Administração, seja de tempo ou de recursos, são a minoria esmagadora.

Além da questão educacional preparatória e da questão estrutural para a aplicação de uma gestão dinâmica e avançada, o gestor que consegue superar essas limitações enfrenta outros problemas: o estado da equipe de que dispõe e a limitação na correção de comportamentos inadequados.

As equipes de que o gestor público dispõe são formadas aleatoriamente, sem que ele tenha qualquer ingerência, através de concurso público. Em alguns lugares e dependendo do nível hierárquico do gestor, ele pode dispor de cargos em comissão de livre nomeação e exoneração para convidar pessoas em que confie, mas, ainda nesses casos, essas nomeações são limitadas a determinada porcentagem dos cargos. Os demais necessariamente precisam ser preenchidos por servidores de carreira.

Não há aqui qualquer demérito aos servidores, a Constituição de República e o ordenamento jurídico por ela embasado têm razões fundamentais para sua existência e manutenção, assim como para evitar a burla através da permissão de contratação em massa por livre nomeação.

Como estudado em item anterior, o instituto do concurso público busca preservar e valorizar a moralidade, a publicidade, a impessoalidade, a eficiência e a legalidade na Administração Pública. Não há dúvidas de que um concurso público sério possui o condão de cumprir vários dos princípios na contratação de pessoal, mas o que podemos dizer sobre a eficiência?

Resumidamente, pois já explanado, a eficiência é a busca do melhor resultado com o menor prejuízo em qualquer ato administrativo. Traduzindo para o concurso público, ou seja, para o ato administrativo de selecionar e contratar servidores, a eficiência significa a busca do servidor melhor preparado para aquela vaga.

Os concursos para preenchimento de cargos de nível mais elevado, como magistrados e procuradores, possuem várias fases, inclusive análise psicológica e prova oral. Ambas as fases possuem prós e contras. As vantagens estão na possibilidade de analisar o perfil psicológico e a postura pública dos candidatos. No entanto, são passíveis de subjetividade e influências externas nos resultados.

Ocorre que os demais cargos não têm sequer análise de perfil. Isso provoca a contratação de pessoas sem nenhuma vocação para as funções práticas que serão desempenhadas, isso sem considerar, ainda, o caráter volitivo de cada contratado.

Uma das modernas teorias da administração é a gestão de pessoas por competências - junção de conhecimento, habilidade e atitude - para adequar os funcionários aos setores mais indicados das corporações, de acordo com seus perfis. O conhecimento é técnico-educacional e pode ser aferido através de concurso de prova. A habilidade, ou seja, capacidade de produzir o resultado satisfatoriamente através do correto uso do conhecimento, também pode ser avaliada, ainda que precariamente, através de prova. A atitude, que depende diretamente das características da personalidade e da vontade de cada um, por sua vez, só pode ser verificada no ambiente real de trabalho.

As instituições privadas têm plena mobilidade de capital humano, pois, mesmo podendo parecer cruel, o mercado tem inúmeros profissionais ávidos por uma boa colocação e um colaborador que não se encaixe nos requisitos da corporação pode simplesmente ser substituído. Nesses lugares, portanto, há a real possibilidade de adequação dos perfis dos profissionais às atividades desenvolvidas e resultados esperados.

Na Administração Pública, há alguns exemplos de instituições que procuram usar a análise de competências na lotação de seus servidores, como o Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI e o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES. Nesses dois lugares, após a aprovação em concurso de provas e títulos, os servidores recém-contratados preenchem formulários com questões de vários tipos e passam a fazer parte do banco de talentos institucional. Indicam, ainda, a ordem de preferência dos setores em que gostariam de trabalhar.

As questões são formuladas com a participação dos chefes de cada setor e visam a identificar o perfil de conhecimentos e habilidades necessário para os colaboradores. A indicação da ordem de preferência, por sua vez, visa a preencher o item da atitude, pois esta exige vontade e pró-atividade.
São poucas as instituições de caráter público que tentam aplicar a teoria da gestão por competências e, mesmo nessas poucas, a aplicação acaba não produzindo os mesmos resultados que quando aplicada nas corporações privadas. O fato é que, ao revés da iniciativa privada, a Administração Pública não tem ampla mobilidade de recursos humanos.

O que fazer com os servidores públicos que não demonstram o conjunto de conhecimento, habilidade e atitude para nenhum dos setores do órgão? Muitas vezes, muito mais do que pessoas externas imaginam, os gestores públicos se deparam com servidores que têm conhecimento e habilidade, mas não têm vontade de produzir. Há também casos mais graves, principalmente com servidores muito antigos, que deixaram de acompanhar as mudanças no passar do tempo e sequer seus conhecimentos e habilidades são suficientes. Há muitos que não sabem ao menos ligar um computador.

Diante dos relatos, a questão da estabilidade no serviço público se mostra como agravante. Por mais que a Administração busque investir em capacitações, os gestores públicos não têm como impor vontade de aprender aos servidores e também não têm como obter os resultados almejados com servidores mal preparados e desmotivados. Ao mesmo tempo, a estabilidade significa a certeza da manutenção da remuneração, ou seja, ausência de risco por falta de produtividade.

Foi instituída no Poder Executivo Federal uma gratificação vinculada a uma avaliação feita pela chefia do servidor. Ocorre que tal avaliação não é aplicada com grande seriedade na maioria das lotações. A falta de preparo educacional, em regra, não é considerada falha do servidor, mesmo com cursos e recursos disponíveis para seu aprendizado, e a falta de produtividade para que enseje uma má avaliação, precisa ser comprovadamente dolosa. O fato é que dificilmente os servidores não recebem a gratificação.

Os processos administrativos disciplinares que podem ensejar qualquer tipo de penalidade a um servidor precisam de causas e provas muito graves e estruturadas, ou seja, os gestores estão praticamente de mãos atadas em relação à falta de comprometimento eventualmente demonstrada. Vale mencionar que a disponibilização dos servidores ao RH significa baixa sem reposição na equipe, ou seja, tem limitação prática.


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*Lais Fraga Kauss

Procuradora Federal. Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS no Rio de Janeiro - Advocacia-Geral da União - Procuradoria Regional da PFE-INSS 2ª Região. Pós Graduada em Direito Constitucional – Universidade Estácio de Sá. Pós Graduada em Direito Público e Privado – Universidade Estácio de Sá – EMERJ. Graduada em Direito – Universidade Federal do Rio de Janeiro.

*Artigo originalmente publicado na Revista JUS Navigandi e autorizada a publicação pela autora.

Um comentário:

  1. "Ocorre que os demais cargos não têm sequer análise de perfil. Isso provoca a contratação de pessoas sem nenhuma vocação para as funções práticas que serão desempenhadas, isso sem considerar, ainda, o caráter volitivo de cada contratado."
    Através das exigências e a adição de outros requisitos para o Concurso Público isso pode ser quase que totalmente resolvido. Na Educação, no atual Concurso de Agente de Organização Escolar, prevaleceu a ideia de uma avaliação pouco exigente, no sentido pedagógico, uma vez que os vencimentos oferecidos eram diametralmente opostos a qualquer manifestação de qualidade do concursando.

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