Congresso 2015

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quinta-feira, 2 de junho de 2011

Gestão Previsional de Competências: Desafios e Possibilidades de Aplicação no Contexto Brasileiro [Parte 3]



por Silvana Ferreira Pinheiro e Silva [*]

Limites e interesses da GPEC

Alguns autores consideram a GPEC como uma grande oportunidade de aprendizagem, que oferece suporte pragmático para a gestão de processos de mudança, porém outros autores concebem a GPEC como um conceito mais teórico do que prático (ANTONMATTEI et al., 2007).

As insatisfações referentes à GPEC, tratam essencialmente da possibilidade ou não de efetivação do planejamento de cenários futuros.

Neste contexto, Antonmattei et al., (2007), apresentam um importante questionamento: é necessário tentar prever as necessidades de empregos e de competências em um horizonte de alguns anos, considerando o conjunto de fatores que são suscetíveis de afetá-los, ou será necessário buscar e desenvolver a capacidade de flexibilidade, para poder reagir aos eventos futuros?

Acredita-se inicialmente que as duas vertentes são necessárias, do ponto de vista estratégico.

Para Mallet (1991), a validade da GPEC está justamente na possibilidade de antecipação de cenários futuros, e por consequência, na definição de diferentes itinerários que possibilitem ligar o presente a cada um dos cenários visualizados.

Por exemplo, quando a empresa Boeing em 1990, após a primeira crise do Golfo, dispensou de forma rápida e maciça, um número expressivo de empregados, ela apresentou dificuldades no período entre 1995 e 2000, pois não encontrou mais no mercado de trabalho as competências que ela havia dispensado. Neste período, ela foi ultrapassada pela empresa Airbus (consórcio europeu) que optou por conservar seus empregados, mesmo durante o período de crise (ANTONMATTEI et al., 2007).

É importante destacar que a qualidade de um processo de GPEC não se avalia sobre o nível de sofisticação dos instrumentos e método utilizados, mas pela apropriação dos resultados pelos diferentes atores envolvidos. O verdadeiro alvo deveria ser os próprios indivíduos, que a partir de um processo de GPEC estariam mais aptos a compreender a evolução de seu ambiente profissional, bem como, da seu própria trajetória profissional.


Validade da GPEC

A GPEC possibilitou uma visão mais aprofundada e particularizada sobre as diferentes categorias de emprego (Antonmattei et al., (2007):

Mais recentemente a população dita ¨sênior¨ tem sido alvo de atenção específica por parte das organizações. Na prática percebe-se o crescimento de programas específicos voltados à retenção e socialização do conhecimento desenvolvido ao longo da vida laboral do trabalhador, que literalmente está sujeito a se perder, quando da ocorrência do processo de desligamento. Aos poucos esta visão tem sido ampliada para as demais categorias de emprego, pois o processo de desligamento pode ocorrer por vários motivos e nas mais diferentes fases da vida funcional.
a) Frágeis ou sensíveis - categorias de empregos ameaçados pelas evoluções econômicas ou tecnológicas, como por exemplo, caixas de supermercados substituídos por caixas automatizados;

b) Estratégicos - correspondem às categorias de empregos essenciais no processo de criação de valor para as organizações, como por exemplo os pesquisadores voltados à pesquisa farmacêutica. Podem ter uma gestão de caráter mais individualizado;

c) Sêniors – correspondem às categorias de empregos compostas essencialmente por indivíduos próximos do período de aposentadoria.


Corroborando com este cenário, Sparrow e Bognanno (1997, apud Carvalho et al. 2009 ), propõem a seguinte classificação para as diversas competências organizacionais:


 Emergentes – são competências que podem não ser relevantes para as atividades atuais da organização, mas considerando a estratégia e visão de futuro, serão enfatizadas posteriormente;
 Declinantes – são aquelas que, durante um tempo, foram importantes para a organização e para as atividades desenvolvidas no passado, mas que tendem a ser superadas;
 Transitórias – são as competências que precisam ser mobilizadas durante processos de mudança, embora pontuais e menos enfatizadas na estratégia organizacional;
 Perenes – formam um grupo fundamental de competências organizacionais, intimamente relacionadas à obtenção do desempenho desejado, permanecendo relevantes para as tarefas ao longo do tempo, seja qual for a direção estratégica da organização.
Nesta ótica fica claro que não se pode tratar todos os indivíduos e ocupações profissionais de maneira semelhante. Há que se implementar estratégias diferenciadas, de acordo com a natureza do trabalho a ser desenvolvido.

Outro aspecto positivo em relação à GPEC diz respeito à junção entre o desenvolvimento de competências e a estratégia da empresa. A GPEC tem possibilitado a colocação do foco do plano de formação sobre as necessidades da empresa. Estas necessidades têm sido melhor identificadas graças aos trabalhos efetuados pela GPEC, concernentes aos diferentes tipos de competência, aos referenciais de métier, aos observatórios paritários, entre outros.

Para Kerlan (2007), a GPEC favorece o estabelecimento de um novo compromisso social – a empregabilidade dos indivíduos e a garantia dos percursos profissionais.

Além destes aspectos, a GPEC pode subsidiar:


a) O dimensionamento adequado do quadro de pessoal;
b) A valorização das qualificações e das competências de cada indivíduo;
c) A gestão das mobilidades;
d) O processo de formação ao longo da vida – formação contínua;

e) A gestão individualizada da carreira dos funcionários, o qual constitue-se em um dos eixos da gestão estratégica de pessoas;
f) A gestão da remuneração;
g) A antecipação das evoluções demográficas.
Em síntese, a GPEC é uma demanda antecipativa, preventiva e preditiva, que possibilita a realização de ajustes, dentro de um período de tempo, em função de alterações do ambiente e das escolhas estratégicas, às necessidades da organização e de seus integrantes. Trata-se de uma demanda de caráter permanente, marcada por encontros periódicos, em suas dimensões, individual e coletiva.

Os indivíduos são evidentemente os atores centrais da antecipação. É necessário construir seus percursos profissionais para garantir sua empregabilidade e prepará-los para as mudanças.

Neste foco, Carvalho et al. (2009) destacam que o servidor deve estar consciente da importância do referencial de competências para seu crescimento pessoal. É importante que ele perceba aonde deseja ir profissionalmente e, mais ainda, que essa trajetória profissional precisa ser articulada com as estratégias organizacionais.

Por outro lado, a organização deve fornecer condições, portando um olhar atencioso e constante sobre os processos de aquisição de competências, de formação e de cooperação.


CONCLUSÕES

Embora no contexto francês, a GPEC tenha seu início marcado pela necessidade de antecipar e minimizar as consequências das mudanças estruturais que ocorrem nas organizações, sobre o quadro de pessaol, é possível visualizar elementos que podem contribuir para a estruturação de um modelo estratégico de gestão de pessoas.

A GPEC pode fornecer elementos chaves para facilitar as mobilidades internas e profissionais, os reposicionamentos, o desenvolvimento da empregabilidade e de competências, e assegurar o desenvolviemento dos percursos profissionais. Para a organização, a GPEC possibilita ainda meios para antecipar e diagnosticar sua política de contratação e desenvolver um alto nível de empregabilidade para os funcionários, estruturação e reestruturação de práticas de gestão de pessoas, suporte aos gestores para negociar localmente as condições de flexibilidade, preservando a coesão social de suas equipes de trabalho.

Adicionar o termo previsional coloca o foco sobre a consideração de informações sobre o futuro nas decisões de gestão e sobre a necessidade de se avaliar as consequências destas decisões, de um modo mais efetivo do que se costuma fazer tradicionalmente.

O importante é não deixar as pessoas limitadas a uma especialidade laboral que se encontra em declínio, ou em vias de, a médio e longo prazo. É necessário constantemente indagar: Quais as profissões de amanhã? Quais as passarelas (atalhos, itinerários formativos) para os indivíduos atuais? Qual a capacidade de adaptabilidade individual, frente às mudanças no mundo do trabalho? Qual a capacidade de aprendizagem de novas competências?

Para antecipar as mudanças econômicas, é necessário visualizar as evoluções futuras do mercado, dos produtos, das tecnologias, com o objetivo de possibilitar as adaptações necessárias, considerando os eixos de desenvolvimento territoral, a organização do trabalho e as competências individuais e organizacionais.

A organização deve fornecer condições, portando um olhar atencioso e constante sobre os processos de aquisição de competências, de formação e de cooperação.

Na perspectiva atual de gestão de pessoas, a etapa de desligamento de funcionários também deve ser bem gerenciada, pois constitui-se em uma fase importante, tanto do ponto de vista institucional, como individual.

Destaca-se então a necessidade de incorporacão dos conceitos da gestão do conhecimento, principalmente àqueles relativos ao processo de explicitacão do conhecimento tácito, transformando-o em conhecimento explícito. Outro aspecto importante trata do registro, socializacão e incorporação deste conhecimento – ou seja, a construção da memória organizacional.

Neste sentido, é essencial a concepção e implantação de sistemas de informação que possibilitem o registro de dados e informações, de modo a subsidiar verdadeiramente a geração de conhecimento, suporte à tomada de decisão e desenvolvimento de ações estratégicas.

E citando a área de gestão estratégica de pessoas, um importante desafio está lançado: como passar de um modelo de gestão estritamente reativo, para um modelo antecipatório?

Como bem destacado por Mallet (1991), existem vários métodos para serem utilizados. A resposta mais efetiva de cada organização será o resultado de sua própria construção.

REFERÊNCIAS

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ANTONMATTEI, P. H.; FAVENNEC-HERY, F.; IGALENS, J.; VIVEN, P. La gestion prévisionnelle des emplois et des compétences: un défi social, économique et juridique. Droit Social, Paris, n. 11, nov., p. 1067-1074, nov., 2007.

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Artigo gentilmente cedido pela autora.

[*] Silvana Ferreira Pinheiro e Silva – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina – IF-SC.

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