Congresso 2015

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quarta-feira, 8 de junho de 2011

Integrando estratégias para potencializar a gestão de pessoas - Avaliação e Desenvolvimento de Pessoas [parte 3]

por Thiago Santos


MOVIMENTO 3

O mal de quase todos nós é que preferimos ser arruinados pelo elogio, do que salvos pela crítica – Friedrich Rückert
(avaliação como pivô estratégico na gestão de pessoas)

Por que evitamos tanto avaliações se estas são tão comuns e corriqueiras em nossas vidas? Dia a dia avaliamos tudo ao nosso redor. Quando entramos em um supermercado e encontramos dois produtos para o mesmo fim, avaliamos, pesamos as qualidades e as vantagens de levar um ou outro produto. Às vezes pesa a qualidade ofertada por um produto; outras vezes, vale o costume – já consumo esta marca há muitos anos, prefiro não mudar. São muitas as possibilidades, mas todas elas fruto de nossos julgamentos e avaliações.
Por que na vida profissional seria diferente? As organizações precisam avaliar o seu desempenho e de seus colaboradores. Sem avaliação não existe gerenciamento. A avaliação é um instrumento tão necessário à prática da gestão quanto o GPS (Global Positioning System) para a navegação. Costumo dizer que processos de avaliação de pessoas bem estruturados são o GPS (Gestão de Pessoas Sustentável) para o RH, vejamos o por que.
Na navegação estipula-se o destino (onde se pretende chegar) cadastrando-o no GPS. Este instrumento por sua vez localiza o navegador no território. A partir destes dois pontos – localização atual e localização pretendida – ele traça o melhor trajeto; pode-se definir rotas alternativas. E o melhor, qualquer desvio da rota traçada, ou mudança do destino, automaticamente ele orienta o navegador neste novo percurso.
Façamos agora o mesmo exercício com a Gestão de Pessoas Sustentável e, é lógico, estratégica. A organização tem bem definido onde pretende chegar (o seu destino). Define este destino em sua política de recursos humanos. O processo de avaliação (GPS do RH) localizará, por sua vez, a situação atual dos profissionais, permitindo que se trace o melhor trajeto para alcança o destino pretendido; pode-se definir rotas alternativas. E o melhor, qualquer desvio da rota traçada, ou mudança do destino, ele orienta o gestor neste novo percurso.
Esta comparação se torna mais interessante se observarmos os detalhes. Navegar provém do grego kubernétikê (cibernética), arte de pilotar e arte de governar. Platão em A República fez esta analogia de governo e navegação; dirigir um navio é como dirigir o Estado. O gestor, como dirigente, assemelha-se a prática de um micro-governo, privado e administrativo, mas nem por isso menos navegador.
Como demonstrado, a avaliação é primordial para uma moderna gestão de pessoas e recursos humanos. A avaliação possibilita a medição e só com medição podemos avaliar – um ciclo virtuoso necessário à gestão de pessoas e recursos humanos. Tudo isto parece lógico, mas cabe agora um pergunta pouco confortável: se é tão lógico e óbvio, por que tão difícil? Esta pergunta não é fácil de responder e tem sido motivo de esforços e energias intelectuais de diversos acadêmicos que procuram respostas a este problema. Em linhas gerais podemos concluir que a dificuldade reside em que a avaliação de pessoas diferencia, individualiza. E essa diferenciação gera descontentamento por vários motivos, os quais trataremos a frente.

Meritocracia
A diferenciação e a avaliação estão plenamente associadas à meritocracia, regime da equivalência. Do latim, mereo: merecer, segundo aptidão. O seu princípio básico é premiar bons desempenhos; promover os empenhos individuais; hierarquizar pessoas socialmente segundo suas conquistas. Divide aquele que se empenha por um resultado, que busca crescimento, daquele que se acomoda em uma estabilidade. Garante que as conquistas são sempre mediante o mérito próprio do indivíduo. Quebra com as relações de costumes, hereditariedade ou apadrinhamentos.
Dentro das organizações, públicas ou privadas, cada vez mais o conceito de meritocracia está sendo abraçado. Para colocar em prática tal conceito os principais instrumentos são os processos de avaliação de pessoas e de desempenho institucional. Apesar de muito se falar das inovações trazidas por estes instrumentos meritocráticos é prudente relembrar que este conceito não é novo. Jefferson já afirmava que a sociedade deve seguir um princípio da meritocracia dos talentos: a cada um segundo os seus talentos.
Nas organizações públicas do Brasil o conceito de meritocracia aparece com a primeira Constituição brasileira, datada de 25 de março de 1824. No artigo 179, item XIV, constou:
“Todo cidadão pode ser admitido aos cargos públicos civis, políticos ou militares, sem outra diferença que não seja por seus talentos ou virtudes” [1].
Neste momento, apesar de se delinear uma política meritocrática, esta não define as formas de se diferenciar os talentos. Este conceito foi sendo aperfeiçoado até a Constituição de 16 de julho de 1934, que institui o acesso universal, a todos os brasileiros, aos cargos públicos, mediante concursos de provas ou títulos.
O concurso público para ingresso em um cargo público é um dos primeiros instrumentos objetivos e gerais da administração pública para selecionar profissionais mediante a aferição de mérito próprio de cada um. Só é aprovado aquele que se esforça e se dedica a ampliar seus conhecimentos para ser aprovado no concurso. Este processo já está amplamente difundido e é o principal meio de acesso aos cargos públicos atualmente. O resultado dos concursos possui legitimidade frente a sociedade e pouco se questiona a sua existência e seu método.
Atualmente, outros instrumentos estão sendo utilizados pelas organizações públicas para transformar o conceito de meritocracia não apenas em um instrumento de acesso ao cargo público, mas de manutenção, mobilidade funcional e gestão estratégica de pessoas. Os principais instrumentos são os programas de avaliação. Os métodos são muitos, citamos alguns: avaliação de desempenho, avaliação de competências técnicas, avaliação de desempenho institucional.
Estes programas apesar de conceitualmente serem tidos como essenciais para o bom funcionamento de uma organização pública por garantir transparência na tomada de decisões referente à gestão de pessoas, ainda são vistos com reticências pelos servidores públicos. Conforme destacou Barbosa,
“quase todos concordam, em tese, que o desempenho deve ser o principal, se não o único, critério de avaliação dos funcionários. Portanto, do ponto de vista representacional, as pessoas se dizem adeptas de uma meritocracia”[2].
Contudo, destaca que a falta de confiança nos instrumentos e nos resultados apresentados levam ao descrédito dos sistemas de avaliação, considerando injustos os seus critérios. Assim, em uma cadeia lógica de raciocínio, os servidores acabam por considerar que a temporalidade, ou o critério de antiguidade, torna-se um mal necessário para minimizar as injustiças criadas por instrumentos que não garantem a exatidão dos resultados das avaliações de pessoas. Por fim, a autora conclui que a resistência na avaliação dos servidores reside também no descompromisso das chefias com esta prática, pois avaliar uma pessoa, além de não ser fácil e demandar tempo, esforço e requerer determinação para auxiliar o servidor a melhorar o seu desempenho, pode gerar insatisfação junto aos colaboradores.
Colaboradores insatisfeitos são empecilhos para o bom desenvolvimento das atividades diárias e para o clima interno da organização. As organizações optam, muitas vezes, por manter servidor com desempenho pífio, mas em um ambiente estável; não se arriscam a criar uma equipe de alto desempenho, o que envolve instabilidade pelo menos no período transitório de mudança. Como ressaltou o físico Marcelo Gleiser, “o preço do novo é o declínio da ordem”[3], mas este declínio é essencial para o progresso. A falta do declínio da ordem mantém uma harmonia imobilizadora, um equilíbrio-fim, uma satisfação estagnadora. Resgatando Guimarães Rosa, o animal satisfeito dorme.
Continuando com a pesquisa realizada por Barbosa é preciso repensar os projetos de avaliação. Torná-los confiáveis e enfrentar o declínio da ordem inicial são um dos primeiros quesitos para conseguir obter o apoio daqueles que serão avaliados, além de ser requisito para legitimar as avaliações perante servidores, chefias e sociedade. Afinal de contas, a meritocracia já é um valor social amplamente difundido.
Neste sentido uma meritocracia deve representar o interesse e obter a confiança destes três segmentos (servidores, chefias e sociedade), para alcançar seus objetivos. Portanto, afirmamos com Barbosa que,
“o sistema meritocrático é uma exigência de uma sociedade democrática que, do ponto de vista dos princípios, garante a igualdade de oportunidade para todos (..). Na medida em que as nomeações, as promoções e o reconhecimento público recaem em indivíduos capazes, de competência reconhecida e comprovada, esse princípio é concretizado, pois as oportunidades estão abertas a todos e não se limitam a pessoas dotadas de relações pessoais e de parentesco ou possuidoras de status hereditário ou privilégios corporativos. (...) A meritocracia alia igualdade de oportunidades e eficiência na seleção de pessoas”[4]
Como vimos, a avaliação de pessoas é imprescindível para a moderna gestão de pessoas e de recursos humanos, valoriza a meritocracia que não deixa de ser uma exigência de uma sociedade democrática, na medida em que garante igualdade de oportunidades, beneficiando as pessoas e organizações pelo reconhecimento de seu esforços e resultados, devidamente medidos, para garantir clareza e igualdade de oportunidade para todos.
Sendo os processos de avaliação um potente instrumento de gestão (GPS) são eles que podem orientar os Boards das organizações, assim como contribuir com os gestores diretos de pessoas nos processos gerais de recursos humanos que atravessam toda a organização.
“processos de avaliação de pessoas devem ser base para ações de redirecionamento ou reforço a comportamentos que, na perspectiva da gestão de pessoas, devem estar associados a decisões de desenvolvimento, sucessão, recompensa, dentre outras”.[5]
A falta deste novo GPS (Gestão de Pessoas Sustentável) dificulta uma ação inteligente, torna inviável uma política de sucessão interna; impede realocação inteligente[6] de pessoas, ou seja, realocações pautadas em dados claros e objetivos sobre os pontos fortes de cada profissional para alocar a pessoa certa no lugar certo – sem “achismos”; dificulta a elaboração de programas de formação realmente efetivos, voltados ao que realmente importa e é necessário. Enfim, com um bom programa de GPS estruturado, quero dizer, com um bom programa de avaliação de pessoas, conjugado com uma política de recursos humanos ousada pode-se potencializar a gestão de pessoas dentro das organizações e torná-la sustentável.
A seguir apresentaremos um relato de um caso de adoção de uma política de avaliação de pessoa que está iniciando sob a perspectiva aqui apresentada.
(continua amanhã...)

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[*] Texto originalmente publicado no CD-ROM do IV Congresso CONSAD de Gestão Pública, ocorrido em maio de 2011.
[1] BRASIL. Constituição do Brasil de 1824. Disponível em <http://www2.senado.gov.br/bdsf/bitstream/id/137569/1/1824.pdf>
[2] BARBOSA, Lívia. Igualdade e meritocracia: a ética do desempenho nas sociedades modernas. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003, p.61.
[3] GLEISER, Marcelo. A dança do universo. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, p. 220.
[4] BARBOSA, Lívia. Ibidem, p. 33.
[5] FERNANDES, Bruno Henrique Rocha; HIPÓLITO, José Antonio Monteiro. “Dimensões de avaliação de pessoas e o conceito de competências” In DUTRA, Joel Souza, et alli. Competências – conceitos, métodos e experiências. São Paulo: Editora Atlas S/A, 2008, p. 152.
[6] Utilizamos o conceito de realocação inteligente de pessoas pegando emprestado o significado de Business Intelligence. Um processo de realocação que passa, em linhas gerais, por etapas de coleta, sistematização e análise, para buscar a pessoa certa para o lugar certo.

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